quarta-feira, agosto 23, 2006

Palavras à solta

"Dirão: talvez o mundo não esteja propício a um soltar de palavras ao vento, assim, sem mais nem menos. Tanto disparate e facilitismo dito às três pancadas, martelado, obriga a proteger as palavras de melhor colheita. Mas, na verdade, é talvez quando o mundo, a poesia, a vida, a liberdade e os homens andam anémicos e moribundos que mais se reclamam palavras destravadas para desbravar caminhos, erguer novos sonhos, colorir os amanhãs." (Miguel Carvalho, "Palavras à Solta", Visão de 24 de Julho de 2006)

Procuro palavras sem travões!

(E porque gosto das crónicas do autor: http://visaoonline.clix.pt/default.asp?SqlPage=AuthorContent&CpAuthorId=19584)

segunda-feira, agosto 21, 2006

Capacidade amputada (curta-metragem 4)

Não sou capaz de te amar. Não sou capaz de voltar a ver os teus vinte anos nem de imaginar o teu corpo antes do tempo que passou por ele. Pesadamente… Vejo agora um homem que não amo. Não respeito. Tudo continua a arder à nossa volta e nós secámos até nos transformarmos num riacho murcho. Seco. Árido e deserto onde nada vai crescer… nem nascer…

O que devo fazer ao desejo póstumo que sinto de outros corpos, de outros espaços, de outras emoções? Que farei com esta vontade de voar? Para onde me lançarei com estas novas asas renascidas, amputadas quando acreditei que te amava, que te amaria? Foi esse amor que me amarrou a ti e a esta casa e a este lugar que me deixou tão amarga e destemperada, tão desesperada pelos anos perdidos, tão angustiada pelos corpos que já não amarei porque a idade também passou por mim…

Está tudo perdido. Secámos até à infertilidade. Ou foi a minha infertilidade que nos secou? Sem filhos e sem amor, que faremos com esta vida que ninguém quer?

Estou perplexa diante deste pedaço de papel onde te anuncio que vou embora e desta vez para sempre. Não voltarei só porque estarás à minha espera. Desta vez, não! Sei que já não tenho idade para emoções juvenis e que talvez não encontre outro homem, alguém que me renove a alma, mas prefiro definhar sozinha a ter que acompanhar o nosso fim. Com raiva. Com pena de ti porque ainda me amas à tua maneira. Com medo de voltar a estar só.

Desta vez, escrevo-te um guardanapo definitivo.

sábado, agosto 19, 2006

Inocência

Todos os vestidos rasgados
o verniz roído a vermelho
as meias raspadas na espera
e a boca-rocha roxa
num corpo de areia que fendeu.

Quem te fez tropeçar dos meus olhos
e seguir em linha recta até ao chão?

terça-feira, agosto 15, 2006

Aveiro - Berlin

... foi bom! paisagens e natureza... paisagens e eu, de quem não pude escapar. paisagens e sempre a mesma sensação de não poder sair daqui de dentro... e eu a ver as coisas e a perdê-las e a abandoná-las à inevitável realidade de se transformarem em mim, filtradas e infiltradas pela sucção violenta e húmida do olhar... o meu olhar míope... a viseira do capacete forrada de sangue... a metáfora do mundo num contingente de mosquitos esmagados...