quinta-feira, novembro 09, 2006

Cobardia (curta-metragem 8)

Era uma vez uma rapariga cobarde que só conseguia amar se soubesse que tudo teria que acabar! Entregava-se aos amores mais destruidores, aos amores desgastantes, aos amores longínquos, porque encontrava assim desculpas para terminar com todos esses enganos e alegar os erros que qualquer humano deve cometer para avançar… Claro que esses supostos amores também serviam para sofrer e dignificar a sua função de amante.

E é verdade que sofria! Apaixonava-se e distanciava-se sempre com dor: a dor da despedida, breve ou para sempre, a dor da ausência, a dor dos sentimentos incertos que sufocam e parecem matar… a dor de saber que nunca mais. Quem a conheceu (eu conheci-a!) sabe que não amava de propósito, não sofria de propósito, assim como não se vive ou se respira de propósito: tudo acontecia simplesmente e ao acaso, sem vontade de ninguém! Às vezes dava consigo a pensar que não queria nada amar ou enrolar-se e enganar-se com este ou aquele, esta ou aquela, mas acabava por acontecer! Mesmo contra a vontade mais ferrenha.

Disse-me, numa tarde de inverno deitada sobre uma areia molhada, que não lhe apetecia nada gostar de mim porque teríamos que terminar, que eu também sabia disso e que, por isso, só estavamos a perder tempo.

"E que o tempo, mesmo tendo sido feito para se perder, deve ser perdido com algum pudor, com algum respeito, com comedimento".

Claro que perder tempo comigo era uma perda tão grande como com outro qualquer… A verdade é que não me queria amar. Eu compreendi. Deixei-a deitada na areia e caminhei para longe. Para outro país.

Era uma vez uma rapariga cobarde que tinha medo de amar e que amava sempre demais, enorme erro. Queria amizades e, ironicamente, perdia todos os amigos porque se impunha sempre o desejo maior de querer ir além do que lhe tinha sido destinado no elenco da amizade. Todas as encenações de amigos falhavam… Quis ser minha amiga. Eu quis ser seu amante. Foi esta inversão de papéis que nos separou: eu amei antes dela…

Era uma vez uma rapariga qualquer que…

11 comentários:

Anónimo disse...

que produção... que outras coisas fazes na vida? ;-)

e só passei por passar...

Diogo disse...

Como é que acaba a história?

Ida disse...

Acho que há aí pedaços de muita gente. Melhor deixar pra lá. Saio de fininho. Que horror, rapariga... mania que tens de que vês coisas... E acho que vês, isso é que é pior.

Agora, eu volto para as reações, que certamente hão de vir... aí é que vai ser... também é por isso que escreves, não é?

Ida disse...

Já ia esquecendo: adorei o texto! beijos, daqui!

Btw, tás no hemisfério norte ou nas arábias?

Maria do Rosário Sousa Fardilha disse...

convém termos um pouco dessa rapariga dentro de nós. só um pouco, para evitar depressões. só um pouco, para nunca nos sentarmos em certezas.

inominável disse...

Hemisfério norte, mas de rosto voltado para Sul... que é como quem diz, para baixo...

A. Roma disse...

Creio que era capaz de compreender um pouco essa rapariga. Ou então fingia que compreendia. E quando já nem fingir conseguia dava-lhe um abraço.

Anónimo disse...

"que amava sempre demais, enorme erro".
Não há "amar de mais". Isso é coisa que não existe. só em conversa de homem ouvi esse termo.
Ama-se e pronto, ou não.Digo eu.

Francis disse...

O sentimento não é uma ciência exacta. Se fosse, o mundo seria aborrecido (mais ainda!)
... e espero que desta vez o comentário fique colado no frigorifíco! (Há pouco descolou-se, caiu no chão e não mais o vi)
:-)

inominável disse...

estava por aqui a ouvir Ivan Lins e acho que ele sabe tudo acerca desta rapariga qualquer...

"quero sua alegria escandalosa, vitoriosa por não ter vergonha de aprender como se gosta /

quero toda sua pouca castidade, quero toda sua louca liberdade, quero toda essa vontade de passar dos seus limites e ir além"

(canção "Vitoriosa")

Anónimo disse...

Quando as da berma da estrada entram no escritório... Procura ajuda profissional...